O SACRILÉGIO.

29 dezembro 2007

Algum tempo atrás, numa vila distante, os velhos contavam as crianças sobre uma mulher tenebrosa, que assolou todo o mundo com a sua maldição. Essa mulher era muito má e muito poderosa. E como todos os que são poderosos, ela era amada ou odiada pelos que tinham a coragem, ou o acaso, de conhecê-la.
No entanto, não é dos grandes feitos de sua maturidade que falaremos aqui. Aqui, contarei a vocês o que um velho violeiro viajante me contou em suas incursões por minha terra natal.
Estávamos, eu e o violeiro, sentados na calçada sombreados pela cruz da igrejinha local que se erguia em nossa frente. Ele, enquanto tocava algumas notas em sua viola, observava o público que deixava a missa. Pessoas pobres e com roupas gastas, mas as melhores que possuíam. Todos em grupos. Todos em família.
Foi aquela visão que suscitou, em algum ponto de sua mente cansada, as lembranças que ele começou cantar...
Disse ele que falaria então, não da glória e do triunfo de nossa sombria dama, mas de como em sua juventude, no auge do surgimento da maldade, ela cometeu o seu primeiro sacrilégio.
Ela era uma moça bonita, qualquer um que olhasse aprovaria, tinha sorriso no rosto e quase nunca se vestia de preto (como no futuro passou a fazer constantemente). Tudo a sua volta era paz, e toda a paz gerava alegria. Era uma época de harmonia duradoura, tudo parecia estar no lugar certo, menos o coração da moça.
Em seu coração tempestades faziam casa. Um coração tão juvenil que mal se podia conceber a força que ali se escondia. Seria mentira dizer que ela estava sozinha, mas quem estava com ela não ajudava. "Sim, ajudava!" Diriam os que a admirassem mais tarde; mas naquele momento, naquele lugar, qualquer um que pudesse ter acesso aos pensamentos da cabeça da moça teriam abominado a figura que a incentivava.
A moça já tinha sido iniciada nas artes das trevas, secretamente, é claro, como se saberia mais tarde. Mesmo com toda aquela mocidade ela já havia se tornado o que, só de ouvir falar, todos temiam: um ser maligno sugador de vida, chamado em algumas culturas de vampiro.
Ela tinha se tornado algo estranho, e ainda que seu peito vacilasse, suas intenções eram cruéis, e a fome a incitava, a pressionava, fazia com que ela se desesperasse por comida! E quanto mais ela ansiava, mais frieza deitava em seu coração, mais desprezo ela nutria por quem a cercava...
Por fim chegou o dia, o momento em que todas as suas defesas caíram, o ponto onde o último fio de bondade que resistia se rompeu. E naquele dia ela resolveu ferir, ela decidiu matar se fosse necessário. Não importava mais o que diriam, não importava a dor que causaria. Nada mais fazia sentido, nada tinha mais valor. Só ela, e seu coração insaciável.
Foi numa festa de família, junto de todos que diziam a ela amar, que tentou pela primeira vez algo, que depois de uns anos, passou a ser um hábito.
Ela sugou de cada um, sugou sem que notassem. Cada gotinha escorria para dentro de sua boca, e eles sorriam, como se não percebessem nada. Como se todo aquele mal, talvez, nem fosse tão mau assim... Como se fosse até agradável. Talvez gostoso, mas não seria essa a palavra certa.
Seus olhos brilhavam em êxtase, e sua mente armava planos para continuar com aquilo durante toda a noite... Até que alguém sentou ao seu lado. E esse alguém era uma mulher muito esperta e bonita. Essa mulher começou a falar de livros, de músicas. Essa mulher começou a falar da vida. Ela não falava como o resto da festa; ela não olhava como o resto. Essa mulher já lhe tinha ensinado uma vez a enxergar que existiam pessoas diferentes. E ela estava fazendo aquilo novamente, e mais uma vez, ninguém podia perceber.
A nossa moça então se enterneceu, e o fio de bondade se restaurou, ela não teve mais coragem de continuar o banho de sangue. Ela não teve mais coragem de desprezar aquela festa.
O fundo de sua mente ainda girava num turbilhão de pensamentos, sentimentos e dúvidas.
O violeiro então sorriu para mim, assim que terminou sua canção. Ele apontou lá pra igrejinha, onde não tinha mais ninguém, e disse:
E foi assim que se deu o seu primeiro sacrilégio: interrompido brutalmente por seu amor pela raridade. Mas não se engane, minha pequena - ele continuou - não se engane pensando que foi sempre assim... Essa moça fez coisas terríveis, algumas delas indizíveis! Mas em sua mocidade, era apenas uma menina, assim como você, cheia de sonhos e vaidade...

8 respostas:

Anônimo disse...

Acabou tão rápido!...

Anônimo disse...

bonitinho, apesar do vampirismo...

ps: nothing new to tell, lady!

Anônimo disse...

ah, fechei o msn também :D

Anônimo disse...

Ah, great, Hobbs...
Agora não nos falamos mais...

tsc.

Eu nem vou falar nada.
Espero que vc saiba o que está fazendo de sua vida.

Anônimo disse...

Bobinha! =p

Anônimo disse...

darling!

entrei no link que vc botou no comment do penúltimo post do mister vox...aquele conto até era legalzino mas...NADA comparado a este!!!

This is BEST thing i´ve EVER read in the net!

maravilhoso!

Anônimo disse...

Hahaha!

Pois é, não é?
Eu li esse também...
Interessantíssimo!

Minha única crítica a este é que ele é muito longo, e quando chega do meio pro final fica um pouco enfadonho, repetitivo.

Mas o final é ótimo!
O conto vale pelo final.. hehe!

Anônimo disse...

oh sweetheart!

it´s alright now -- i´m coming!

ps: entre no msn *hoje* -- ou me acor, ops!, me ligue amanhã!