Genealogias

30 setembro 2009

Tem momentos da vida em que temos que parar, olhar para trás, e tentar entender como foi que chegamos até aqui. Já começo esse texto me referindo ao Olavo, porque ele me ensinou uma coisa que nunca vou esquecer; ele me ensinou a adotar minhas idéias. Explico:
Devemos sempre partir do princípio que uma idéia (qualquer uma) nunca surge do nada. Ela tem um dia de nascimento, ou melhor, uma data de aparição. Nossas idéias (quase todas) vieram de algum lugar. E quase sempre este lugar não é a nossa cabeça. Eu poderia aqui fazer um longo desvio para falar de teoria do conhecimento, mas não é a minha intenção. Vamos, então, voltar ao surgimento das idéias. E para o texto não cair na abstração inútil, passemos logo ao exercício:
Pegue uma idéia que você tenha, pode ser a que mais te agrada; agora tente descobrir como ela foi parar aí dentro da sua cabeça. Não tente argumentar. Não tente justificar. Não tente defender a idéia. A trate como se ela fosse uma jovenzinha ingênua, que você viu nascer e crescer, que você alimentou e cuidou até que chegasse hoje e ela aparecesse assim, toda enfeitada, desse jeito como você a pensou agora.
Conseguiu? Então vamos concretizar um pouco mais as coisas. Conto um caso...
Quando eu tinha seis anos de idade, estava brincando com tintas na casa do meu tio, enquanto ouvia minha tia, minha avó e minha mãe, tagarelarem sobre a vida de um outro tio meu que era meio perdido. Eu era uma criança feliz, já não acreditava mais em Papai Noel, mas ainda era feliz. Até que ouço minha mãe dizer: "Imagina! Ele nem mesmo acredita em Deus..." Opa. Como é que é? Ele não acredita em Deus? Alguém não acredita em Deus?.. E assim a Day, tal qual vocês conhecem hoje, começou a existir. E naquele momento também começou a existir o meu problema com a idéia de Deus. Notem que essa idéia não me chegou de forma pura e abstrata, - "É possível a não existência de Deus" - não, ela chegou junto com a idéia de que para se duvidar da existência de Deus você deve ser um perdido, alguém que faz algo que os outros desaprovam, alguém que difere do que é aceitável. E tudo isso fez parte da minha "idéia de crença em Deus". Essa idéia teve consequências terríveis, das quais tentei me livrar durante anos, e nas quais continuo a me debater; só que agora sofro com um pouco mais de conhecimento de causa.
Tomar consciência do surgimento das minhas idéias tem me feito um bem enorme. Assim eu consigo entender muito melhor como as coisas se desenvolvem dentro da minha cabeça, e consigo perceber em que ponto específico eu insiro coisas propriamente minhas nas minhas confusões mentais. Dessa forma eu consegui entender que minhas idéias (todas até agora) são filhas adotivas, que eu amo e cultivo. E cuido para não se perderem por aí.
Vocês deveriam tentar...
Nesta última semana eu resolvi ousar um pouquinho e aplicar esse mesmo mecanismo de reconhecimento de idéias a algo maior, e bem mais complicado. Eu resolvi parar, olhar para trás, e tentar entender como foi que eu cheguei até aqui. Imaginem a surpresa: descobri que a minha vida também é adotiva.

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