A queda

10 dezembro 2009

A vida é uma sádica que adora fazer piada das nossas fraquezas. Eu, por muito tempo, me debati aqui dentro achando que precisava de espaço, achando que eu era o que havia de essencial, pensando que a felicidade - ou qualquer coisa do tipo - só viria se fosse por minhas mãos. E ela... Ela sempre foi só a máscara. Só a roupa que eu colocava pra ninguém desconfiar da crueldade que existia por baixo.
Ela sempre me enfeitou com aquele olhar bonzinho e casto. Com a voz simples, infantil, até. Era tudo adequado para que ninguém me visse. Enganava bem. Bem demais! Que teve hora que até acreditei que eu também era ela...
Eu ia me apertando aqui dentro e dando o meu jeito de sobreviver, até que o bonde descarrilhou. Era possível viver com a minha miséria quando tudo em volta também era miséria, mas quando tudo virou... amor... eu comecei a sufocar. A pressão ficou intensa, eu comecei a chutar a máscara, que começou a tremer. Os mais atentos a viram quase cair, mas ela já estava colada há tanto tempo que... eu percebi que ela não era mais só uma máscara. Eu comecei a pensar, então. Como não sou muito de pensar, isso deu trabalho. Eu comecei a pensar que, talvez, ela fosse mesmo um pouquinho de mim; afinal, tinha sido eu a construí-la. Eu pintei cada pedacinho, eu enfeitei e dei brilho. E... e se ela também fosse eu? Se fosse eu podia... Eu pensei que eu podia até começar a tentar também ser ela. Por que não? Ela era melhor, era mais bonita, era mais fácil, era mais adequada. Eu era só aquela coisa que ficava escondida. Que tentava, de longe, entender o que era aquilo que eles sentiam uns pelos outros. Que tentava reproduzir aquilo para continuar vivendo.
Eu decidi que seria ela. Eu não morreria, mas me transformaria - e sabia que, como é natural, a transformação doeria mais que a morte. Não seria perfeito, perfeito nunca seria, mas seria possível. Então pela primeira vez na vida eu realmente tomei uma decisão: eu me tornaria a máscara. Não importava o custo, não importava a dor, não importava o quanto eu teria que sacrificar dos desejos que eu tanto cultivava, que eram uma das únicas coisas que eu realmente sabia sentir. Eu me tornaria a máscara, estava decidido.
Aí, tendo a vida a veia sádica que nunca deixa tudo ser simples, ele me arranca a máscara fora e, pela primeira vez na vida, me deixa nua. Eu, só eu comigo mesma, sozinha.
O problema é que sem ela eu não tenho parâmetro. Sem ela eu não sei para onde ir. Sem ela eu serei só isso mesmo: a pessoa que se esconde. Aquela pessoa que não sabe o que é ser... sensível. Aquela pessoa que fará todos irem embora, com asco... Que está bruta e exposta em toda a sua vileza.

E agora o que é que eu faço? Agora eu não sei mais o que fazer...