Bonecas Bonitas

07 outubro 2009

Minhas bonecas eram bonitas. Elas tinham cabelo loiro, eu não. Elas usavam vestido, eu não. Elas usavam batom, eu não. Tinham as unhas pintadas, desfilavam, dançavam, sorriam; eu não. Minhas bonecas eram tudo o que eu não era. Eram tudo o que eu deveria ser.
Não era por achar chato, ou desinteressante, que eu não era como elas, e sim por achar impossível. A verdade é que eu nem tentava. Passava horas admirando o que eu nunca poderia ser.
Até o dia em que cansei, e resolvi que nunca havia tido bonecas. Decidi que nada daquilo era belo. Resolvi que muito melhor eram os livros, que só se mostravam para quem os lessem.

Meu cabelo ainda é preto, ainda não uso vestido, nem batom. E continuo até hoje tentando esquecer que um dia tive bonecas...

8 respostas:

Rafael F. disse...

"Uma epopeia da inveja e da frustração, o novo best-seller de D. Teixeira mostra a América de George W. Bush em chamas"
(Jornalista bundão da Times)

Acho legal sua sinceridade. E felizmente ainda não apareceu ninguém dizendo que você está errada, que bonecas são símbolos do padrão consumista americano, que a mulher é mais do que um estereótipo, que mulher goza, etc.

É engraçado que a maioria das crianças suporte ingenuamente a superioridade de suas bonecas, tentando imitá-las continuamente, sem jamais sentir o abismo infinito que existe entre elas.

Meninas de aparelho, meninas desajeitadas, gordas, baixas demais, com pés feios, cabelo duro, todas imitando as bonecas, nenhuma percebendo que jamais chegará a ser uma boneca. Que na verdade fica tanto mais ridícula quanto mais tenta parecer o que não é.

Não sei se é uma cegueira auto-induzida pela imaginação ou pelo desejo descontrolado de aprovação. Sei que é o que se faz. E que os meninos também fazem isso em relação a outras coisas. Talvez as crianças tenham imaginação o bastante para esquivar-se da impossibilidade concreta de ser o que querem.

Talvez você tivesse um senso da realidade excessivo...

Lorena disse...

"The road of excess leads to the palace of wisdom" - William Blake.

Day disse...

"Talvez você tivesse um senso da realidade excessivo..."

Talvez...

Rafa, você não perde uma chance de dizer que eu não tenho imaginação, né?

Se você estivesse seguindo o Curso do Olavo saberia o quanto eu posso ficar ofendida com essas suas indiretas...

Mas eu não tô ofendida. E não tô porque eu sei que, mesmo que eu tenha uma falta "excessiva" de imaginação, sei que esse não é o ponto central do problema.

Quem dera fosse só isso...

Guilherme Hobbs disse...

Os livros também estão cheios de bonecas. A diferença é que o autor sempre zoa elas: uma hora aparece um canalha que as come e dá no pé. Depois elas ficam sozinhas chorando até morrerem e/ou ficarem velhas e feias. Literatura realista do século XIX é isso contado com umas frases de efeito (nos autores mais sensíveis, o cara, um pulha, mas também um incapaz, não consegue comer a dona, como n'A Educação Sentimental de Flaubert -- e aí é ele que fica chorando, velho e feio).

Quanto a mim, passei o melhor da minha infância montando castelinhos de Lego. Era um menino sozinho, mas quase feliz. Só fui me interessar pelas bonecas mais tarde na vida . . .

Eu disse...

"...meninas desajeitadas...com pés feios, cabelo duro"
O Rafa tava falando de mim aqui é?!
rs...

Day disse...

PEDIDO FORMAL DE DESCULPAS A RAFAEL F.:

Foi mal...
=/

Rafael Falcón disse...

Tamyres, você tem pés feios? E até onde eu sabia você não era desajeitada. Sobra o cabelo duro, mas o seu fica bem, pelo menos me parece. Enfim. Alguém me disse que a Barbie é lésbica.

(resumo: "não tava falando de você, não")

Day disse...

Os pés da Tamyres são bonitinhos. E agora que inventaram aquela chapinha redonda que deixa o cabelo com cachos o cabelo-duro sumiu.

Mas... A Barbie é lésbica? =o

E o Ken? É gay?