Minhas bonecas eram bonitas. Elas tinham cabelo loiro, eu não. Elas usavam vestido, eu não. Elas usavam batom, eu não. Tinham as unhas pintadas, desfilavam, dançavam, sorriam; eu não. Minhas bonecas eram tudo o que eu não era. Eram tudo o que eu deveria ser.
Não era por achar chato, ou desinteressante, que eu não era como elas, e sim por achar impossível. A verdade é que eu nem tentava. Passava horas admirando o que eu nunca poderia ser.
Até o dia em que cansei, e resolvi que nunca havia tido bonecas. Decidi que nada daquilo era belo. Resolvi que muito melhor eram os livros, que só se mostravam para quem os lessem.
Meu cabelo ainda é preto, ainda não uso vestido, nem batom. E continuo até hoje tentando esquecer que um dia tive bonecas...
07 outubro 2009
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8 respostas:
"Uma epopeia da inveja e da frustração, o novo best-seller de D. Teixeira mostra a América de George W. Bush em chamas"
(Jornalista bundão da Times)
Acho legal sua sinceridade. E felizmente ainda não apareceu ninguém dizendo que você está errada, que bonecas são símbolos do padrão consumista americano, que a mulher é mais do que um estereótipo, que mulher goza, etc.
É engraçado que a maioria das crianças suporte ingenuamente a superioridade de suas bonecas, tentando imitá-las continuamente, sem jamais sentir o abismo infinito que existe entre elas.
Meninas de aparelho, meninas desajeitadas, gordas, baixas demais, com pés feios, cabelo duro, todas imitando as bonecas, nenhuma percebendo que jamais chegará a ser uma boneca. Que na verdade fica tanto mais ridícula quanto mais tenta parecer o que não é.
Não sei se é uma cegueira auto-induzida pela imaginação ou pelo desejo descontrolado de aprovação. Sei que é o que se faz. E que os meninos também fazem isso em relação a outras coisas. Talvez as crianças tenham imaginação o bastante para esquivar-se da impossibilidade concreta de ser o que querem.
Talvez você tivesse um senso da realidade excessivo...
"The road of excess leads to the palace of wisdom" - William Blake.
"Talvez você tivesse um senso da realidade excessivo..."
Talvez...
Rafa, você não perde uma chance de dizer que eu não tenho imaginação, né?
Se você estivesse seguindo o Curso do Olavo saberia o quanto eu posso ficar ofendida com essas suas indiretas...
Mas eu não tô ofendida. E não tô porque eu sei que, mesmo que eu tenha uma falta "excessiva" de imaginação, sei que esse não é o ponto central do problema.
Quem dera fosse só isso...
Os livros também estão cheios de bonecas. A diferença é que o autor sempre zoa elas: uma hora aparece um canalha que as come e dá no pé. Depois elas ficam sozinhas chorando até morrerem e/ou ficarem velhas e feias. Literatura realista do século XIX é isso contado com umas frases de efeito (nos autores mais sensíveis, o cara, um pulha, mas também um incapaz, não consegue comer a dona, como n'A Educação Sentimental de Flaubert -- e aí é ele que fica chorando, velho e feio).
Quanto a mim, passei o melhor da minha infância montando castelinhos de Lego. Era um menino sozinho, mas quase feliz. Só fui me interessar pelas bonecas mais tarde na vida . . .
"...meninas desajeitadas...com pés feios, cabelo duro"
O Rafa tava falando de mim aqui é?!
rs...
PEDIDO FORMAL DE DESCULPAS A RAFAEL F.:
Foi mal...
=/
Tamyres, você tem pés feios? E até onde eu sabia você não era desajeitada. Sobra o cabelo duro, mas o seu fica bem, pelo menos me parece. Enfim. Alguém me disse que a Barbie é lésbica.
(resumo: "não tava falando de você, não")
Os pés da Tamyres são bonitinhos. E agora que inventaram aquela chapinha redonda que deixa o cabelo com cachos o cabelo-duro sumiu.
Mas... A Barbie é lésbica? =o
E o Ken? É gay?
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